A experiência vem do experimentar – daí, dessa percepção etimológica surge a palavra de ordem que tão bem caracteriza boa parte dos indivíduos de alma juvenil: o desejo irrefreável de fartar-se de cada momento como se ele fosse a única coisa que temos à mão, o desejo de um viver inconseqüente, desgarrado dos dogmas e leis conservadoras que regem esse mundo tão careta.
Não se pode negar que o discurso seja sedutor. Filmes como o famoso e nem sempre bem compreendido Sociedade dos poetas mortos e o quase marginal A onda cujo remake (digo: make it new) muito me impressionou, sem dúvida alguma, ilustram bem como promessas de liberdade incondicional são úteis no diálogo com a sociedade de massa. Liberdade consentida, não se percebe?, é a mãe dos paradoxos juvenis. Pode parecer atraente, instigante ou qualquer outro adjetivo chocho que venha a agradar, mas não deixa de ser uma contradição absurda.
Se o negócio é argumentar com etimologias, colho uma das favoritas: saber é conhecer o sabor. Todo aprendiz de cozinheiro, todo aquele que pretende ser, à medida de suas possibilidades, um bon vivant sabe que não é engolindo apressadamente sabores e aromas que iremos desenvolver um paladar sofisticado. O paladar se treina com pequenas porções, as quais às vezes exigiram uma nova prova, às vezes idêntica, às vezes com pequenas variações, para que possamos comprovar ou repensar um conceito. Treino é repetição. E para alimentarmos nosso saber, não podemos deglutir com pressa.
Mas aonde quero chegar com tudo isso? À importância do re. Rever um filme, reler um livro, revisitar um ideia, repensar um assunto não são meras atitudes contemplativas de que os velhos caretas não abrem mão. Engana-se quem acha que pensar e contemplar sejam sinônimos. Pensar é justamente revoltar-se com o estado passivo daqueles que ouvem (mas não escutam) uma ideia e já se posicionam para ecoá-la (sem passarem-na pelo crivo da razão).
Na última quinzena revi duas peças de teatro de que gostei muito: O grande inquisidor e In on it (cuja resenha ainda não desembarcou no papel). Se eu confessar que não faz dois meses que eu as vi pela primeira vez, talvez você me ache uma pessoa meio obsessiva. Faz sentido. Uma peça de teatro, mais do que um livro ou um filme, é algo perene. Ainda hoje me arrependo de só ter visto uma vez Aldeotas, peça escrita e protagonizada por um inspirado e lírico Gero Camilo. Mas, pensando bem, a perda talvez tenha sido uma ótima lição: não é experimentando qualquer peça que iremos satisfazer nosso paladar. O novo pelo novo pelo novo de novo não passa de malabarismo retórico; um prato de primeira merece uma segunda degustação. Careta? Caretice é ter medo de re-experimentar.